segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Loucos pelo Moinhos, loucos por uma Porto Alegre mais humana


* Texto de Paulo Vencato.

Para esclarecer, contrapor e divulgar.

Prezados amigos, ambientalistas, defensores do patrimônio cultural e comunidade, neste momento ocorre um embate entre uma parte da população porto-alegrense e o incorporador / construtor. Não temos os recursos econômicos que eles possuem, que possibilita contratar especialistas em Publicidade, Marketing, Jornalismo, Direito, História, Arquitetura e tantos outros.

Nós temos apenas a disposição de enfrentar durante longos 11 anos de árduas batalhas, o resgate dos valores que identificam nosso bairro, e neste caminho tivemos vitórias e derrotas. 

Reportagens ocorridas nos dias 20 e 21 no jornal ZH de Porto Alegre passam a questionar a proteção do patrimônio cultural, mesmo sendo amparado por nossa Constituição, pela Legislacão Federal e Estadual. Querem arrasar tudo. Um empresário, escreveu neste mesmo jornal que "o tombamento viola a liberdade e a propriedade das pessoas e cabe apenas preservar a memória de algo que já passou e que não existe mais. Para isso servem os museus, os álbuns, os arquivos, a lembrança e a própria imaginação." Provávelmente este Sr. não ultrapassou as fronteiras de nosso estado, não passou nem o Rio Mapituba.

Pois bem, este empresário, propõe colocar abaixo os patrimônios culturais de Porto Alegre, tal como o famoso colunista Paulo Santana, como foi sugerido, o Mercado Público. Então, conforme pensam estes senhores, deveríamos demolir aCasa de Cultura Mario Quintana (CCMQ) - originalmente Hotel Majestic, o prédio do Santander Cultural, a Faculdade de Medicina (Famed), o Museu de Arte do Rio Grande do Sul, a antiga Cervejaria Brahma, o Memorial do Rio Grande do Sul, antigo prédio do Hospital Moinhos de Vento, Edifício Ely - atual TumeleroPonte Jaguarão / Rio Branco e tantos outros bens patrimoniais, todos projetados pelo arquiteto Theo Wiederspahn.
Com base neste mesmo questionamento do jornal ZH e do referido empresário, também, seriam demolidos todo o conjunto de casarios de Jaguarão, Bagé, Rio Grande, Pelotas, Rio Pardo, Cachoeira do Sul, Hamburgo Velho e tantas outras cidades do interior, todas com imóveis listados e tombados, a maioria de imóveis particulares. Mas, vamos além, ampliando ao contexto Brasil, também seriam demolidos o Pelourinho em Salvador - Bahia, Ouro Preto em Minas Gerais, Búzios no Rio de Janeiro  e tantas outras. Reportagem e proposta insanas, retrógradas, oportunistas !

Aliás, o Mercado Público de Porto Alegre seria demolido ainda na década de 70, quando foi proposto pelo "moderno" prefeito Telmo Thompson Flores, interventor nomeado pela Ditadura Civil-Militar, para que fosse ampliada a Av. Borges de Medeiros. Este absurdo não foi adiante, mas, todas a linhas de Bondes foram retiradas definitivamente de circulação para implantar linhas de ônibus poluidores. Nem Bondes para museu existem mais. E quem diria, a primeira linha de bondes com tração animal entre o cais e o Menino Deus foi implantada em primeiro de novembro de 1864. Esta foi a segunda linha de bondes do Brasil, precedida apenas pela linha da Tijuca, no Rio de Janeiro, aberta em 1859.

A preservação do conjunto de seis casas da Rua Luciana de Abreu é emblemática, não só para os moradores do bairro Moinhos de Vento, mas para uma grande parte da população de Porto Alegre.

Discordamos integralmente dos julgamentos proferidos pela justiça estadual, contrária a preservação.

Devemos informar aos que não acompanharam o processo judicial, que foram desconsideradas provas que entendemos serem fundamentais. O EPAHC, o IPHAE e o IPHAN, nas três esferas de governo (municipal, estadual e federal), reconheceram valores que caracterizam os bens imóveis como patrimônio cultural. Portanto, são contrários à demolição.

Em vários documentos técnicos foram identificados referenciais estéticos, paisagísticos, históricos e culturais, e além disto, foram apresentados abaixo-assinados, devidamente identificados, comprovando indiscutível reconhecimento popular. O último censo demográfico realizado pelo IBGE em 2010 no Moinhos Vento revelou existir uma população de 7.264 pessoas e portanto, já naquela época, em 2002 os abaixo-assinados já haviam ultrapassado a própria população do bairro, algo em torno de 10.000 pessoas assinaram mais de 380 folhas de abaixo assinados.

Estes dados são estarrecedores. Os documentos continham identificação, assinatura e RG ou CPF de todo o cidadão que se posicionou contrário a demolição e favorável a preservação das casas e do bairro.
Outros pareceres de eminentes especialistas revelaram as mesmas conclusões pela preservação dos casarios, entre os quais:

IPHAN – Arquiteto Carlos F. de Moura Delphin;
IPHAE – Arquiteta Maria B. Kother;
Prof. Arquiteto Dr. Arquiteto Günther Weimer;
Prof. Arquiteta – PhD Briane E. P. Bica;
Prof. Arquiteta Dra. Raquel R. Lima;
Prof. Arquiteta Ana R. S. Cé;
Prof. Arquiteto Maturino S. S. da Luz;
Arquiteta Ediolanda Liedke;
Arquiteto Urbanista Osório Queiroz Jr.;
Arquiteto Renato Mathias;
Arquiteto Roberto L. Sawitzki;
Arquiteta Alice S. Cardoso
Comissão Interdisciplinar de Estudos Sobre o Bairro Moinhos de Vento do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul.

Além disto, o Ministério Público em tempo, levou ao tribunal um atestado do Engenheiro Claudio Alberto Franke Aydos, herdeiro da empresa construtora A.D. Aydos & Cia. Ltda, executora do conjunto de cinco casas da Luciana de Abreu, comprovando-se com documentos gráficos originais, que o projeto arquitetônico das casas geminadas foi co-autoria dos arquitetos Theo Wiederspahn e Franz Filsinger.

Para os julgadores, prevaleceu apenas os dois laudos, um do Arquiteto Caryl Eduardo Jovanovich Lopes e o outro de uma historiadora, ambos de Santa Maria, interior de nosso estado. Consta no Acórdão, algo que para nós, comunidade do Moinhos de Vento é inadmissível: "não impressionam as inúmeras assinaturas reunidas no ‘abaixo-assinado’ promovido pelos moradores do bairro Moinhos de Vento". Desta forma, como se explica a Constituição Cidadã de 1988?
Mas, ao final do Acórdão, as julgadoras deixam ao Gestor Público a grande decisão: 
"De qualquer sorte, o julgamento não coloca empecilho ao seguimento do processo administrativo e sequer o prejudica, à medida que não impede revisão do ato, com reabertura e reenquadramento dos bens"

Para os conhecedores da Carta de Québec, e, conforme parecer técnico do Arquiteto especialista do IPHAN, Carlos Fernando Delphim, membro-associado do Instituto Internacional de Monumentos e Sítios – ICOMOS, não há duvida alguma, essas antigas construções e seu entorno são testemunhas da nossa história, é patrimônio cultural e a população as reconhece como símbolo da identidade do bairro. Existe Spiritu loci neste miolo do Moinhos de Vento, na Rua Luciana de Abreu, neste conjunto de casas da década de 30.

Queremos, ainda, fazer uma última observação: os participantes, inclusive o Brasil, presentes em Québec, Canadá, em 4 de outubro de 2008 na reunião histórica da cidade a convite do ICOMOS, ocasião da 16ª Assembléia Geral, assumiram a declaração de princípios e recomendações para a preservação do spiritus locii através da proteção do patrimônio tangível e intangível, considerado uma forma inovadora, moderna e eficiente de assegurar o desenvolvimento sustentável e social no mundo inteiro.

Gostaríamos que compartilhassem um vídeo que traduz o significado de Spiritu loci de nosso bairro:


Cidade sem passado histórico, sem Spiritu loci, é cidade sem identidade, sem vida.

Moinhos VIVE - Loucos pelo Moinhos

Abaixo, links que traduzem a indignação e a contrariedade quanto a eventual demolição das casas da Luciana de Abreu:

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